terça-feira, 17 de setembro de 2019

O que é Paris ? Eu vivi mesmo isso tudo ?


Tento escrever esse texto enquanto a memória das lembranças que vivi começam a desbotar da minha consciência. Essa volta para Belo Horizonte foi mais aterrorizante do que pensava. Quando peguei o avião, vi uma França recortada em paisagens modificadas. Até o horizonte, os arredores de Paris eram recortados por formas retangulares verdes e laranjas. Perto das cidades entre os campos, as árvores delineavam os limites entre o urbano e o rural. Quando desci 12 horas depois no aeroporto de Belo Horizonte, vi até o horizonte uma paisagem modificada. A terra vermelha e seca era a marca de que há muito tempo não chovia na minha casa. As árvores frondosas e esparsas de Minas Gerais. A mulher chamada Marlene, moradora do barreiro, que durante todas as extensas 8 horas de avião entre Lisboa e Belo Horizonte, me fez lembrar desse sotaque tão amado.

Fazem três semanas que cheguei. É como se você tivesse largado um desenho por terminar e voltasse dois anos depois. O papel continua o mesmo, embora tenha envelhecido um pouco, ele ganhou aquele coloração amarelada. Algumas partes mais complicadas, como as mãos, você nem se lembra mais como faz. Outras partes que você havia começado a colocar cor, mancharam ou perderam a intensidade pelo tempo que passou. E na verdade, quando você olha o desenho... O que estávamos desenhando? Era uma pessoa ou um prédio? Estávamos mesmo desenhando? 

É retomar o inexorável. 

Eu permaneço em estado de comparação. Preservar a memória dessa existência do outro lado do oceano parece essencial pra realizar as mudanças que quero na minha vida aqui. O que foi Paris pra mim?

Muito além de todas idealizações, todas as fotos de Instagram com a torre Eiffel, todas as fotos de vestidos e beijos floridos no sol do verão parisiense e de todos as boinas, bigodes e baguetes embaixo do braço, a pergunta que mais me veio à cabeça nesse tempo foi : Onde está aquela Paris dos filmes ? Onde a cada esquina tinha um acordeão, um francês de bigode e blusa listrada preto e branca, um baguete embaixo do braço e fumando seu cigarro enquanto fala sobre a vida ? 

Até hoje só encontrei a baguete embaixo do braço. Os acordeões nas esquinas são imigrantes ou refugiados buscando uma vida melhor e eles tocam música para que os turistas joguem uma moeda no estojo do acordeão. Os vestidos e beijos floridos foram editados no photoshop, as esculturas e obras magníficas do Museu do Quai-Branly não revelam os massacres contra os povos africanos. Isso e todo o resto, na verdade, se traduz numa fila gigantesca pra subir na torre Eiffel. Conheci muitos parisienses que nunca subiram na torre Eiffel. É um preço exorbitante que alimentaria uma família de 3 pessoas durante pelo menos um dia.

Paris pra mim foi sobretudo um ambiente de adversidades. Eu tinha acesso à uma escola de engenharia de elite e ao mesmo tempo, eu tinha acesso à uma geladeira e uma prateleira vazia em casa. Acesso à pessoas que estavam vivendo a melhor parte de suas vidas, saindo todos os dias, indo em festas incríveis e realizando viagens inesquecíveis enquanto eu chegava em casa e tentava ignorar a necessidade do meu corpo de jantar. Foi um ano e meio dos dois anos que convivi entre as pessoas iluminadas que moravam no céu, enquanto minha alma continuava no inferno. Às vezes eu sinto que minha mente preferiu acreditar que tudo era um sonho. E eu vivi nesse lugar entre a realidade e o abstrato durante todo esse tempo.

Dentro de mim, Paris tem um outro significado. Lembro que todos os dias quando saíamos do metrô, um homem, que morava na estação Pyrénées, estava lá sentado com um círculo de sujeira extremamente fedorenta ao redor de si. Os funcionários do metrô jogavam um desodorante ao redor dele pra justamente inibir o cheiro forte. Sempre me perguntei por qual razão ele acordava todos os dias, sentava-se naquela cadeira, se sujava completamente e ficava olhando as pessoas saírem e entrarem no trem do metrô. Será que ele gostava de observar ou o que ele queria era ser observado? Na rotina dos dias, lembro que à partir de um momento preciso, ele não estava mais lá. Um elemento da minha rotina havia mudado. E na minha consciência, a pergunta "pra onde ele foi?" se manteve constante durante algumas semanas. Teria ele desistido de ficar ali? Talvez ele tivesse finalmente encontrado o que queria ver ou viver. Mudado daquela rotina prisional, aberto a porta de quem ele era e atravessado em direção ao desconhecido que mora dentro da gente. Talvez tivesse falecido, avançado em direção aos trilhos enquanto o próximo trem se aproximava.

Algumas semanas mais tarde, ele estava lá novamente. O alívio pela presença dele e a tristeza por ele não ter conseguido se libertar dali foram imensos. Eu não conseguia me libertar e eu havia torcido durante todas aquelas semanas pela liberdade dele. Estávamos ambos ali, prisioneiros da nossa própria realidade, sem previsão de condicional ou tratamento especial. Mas que realidade era essa que éramos prisioneiros? Eu acordava, tomava uma ducha, ia pra EIVP, estudava o dia todo com o intervalo de almoço, saía com alguém pra conversar sobre aquilo tudo que estava vivendo, voltava pra casa e estudava mais um pouco. A rotina dos dias esconde as regras que nos foram impostas por esse jogo que chamamos sociedade. 

Acreditava que precisava ir em todas as aulas, mas aprendi que as melhores aulas são nas ruas, com as pessoas que estão ali vivendo e tendo experiências únicas e pontos de vista inestimáveis. Paris me fez ver que a maior riqueza que nós temos nesse planeta são essas pessoas. Conheci pessoas que fizeram fortuna trabalhando com advocacia e outras que fizeram fortuna com prostíbulos. Conheci pintores totalmente desconhecidos e geniais em noites completamente absurdas e garçons que como eu, tentavam viver naquela cidade extremamente cara. Conheci o céu e o inferno, mas também conheci o espaço no meio, onde a maioria das pessoas vive.

Paris me mostrou a riqueza que cada um contém. Como os pontos de vista podem se unir pra formar uma nova perspectiva que é mais do que a soma de suas das partes.

Agora fica a pergunta de como usar isso tudo aqui. Nesse desenho inacabado que deixei de lado.

Mas mais importante do que terminar esse texto com uma frase de efeito. Queria te perguntar déjà.

O que você acha?
Share:

quinta-feira, 15 de agosto de 2019

A última flor do Sena



Aos domingos, Paris amanhece estranha… é incrível. Há um marco zero diferente na cidade. Magnetizado, ele puxa os estudantes conforme o sol se impõe. À beira do Sena, lá está a flor, a última (ou a primeira), em um dos raros guetos de prédios novos e ruas largas da capital, encurralada entre o rio e a Biblioteca Nacional, apresento-lhes, mesdames et messieurs, La Barge du CROUS de Paris.

O caminho do beija-flor

É muito fácil chegar lá, independentemente de onde você estiver. Tem tramway 3a, tem a linha 14 do metrô, tem RER C, tem Vélib’, tem a porra da patinete elétrica. Só não tem desculpa pra não ir.
Cuidado! Se pegar a patinete elétrica, não ande na calçada. Se a fiscalização te parar, vai ter uma multinha pesada te esperando.
Indicações precisas de itinerário, só com o Google Maps e afins (aliás, baixa logo o Citymapper, melhor app do mundo pra se locomover em Paris). Sem rumo e sem bateria, vá pra Châtelet e pegue a 14 até a biblioteca, voilà ;)

O néctar

Além dos pratos bem mais ou menos, do jeito que o estudante gosta e tá acostumado, a barge é um ótimo endereço pra ouvir a língua portuguesa, a última flor do Lácio, nos mais variados sotaques. Porque sim, somos parecidos demais e pensamos igualzinho. Acho que a ideia de comer fora num almoço de domingo, em um barco sobre o Sena e por 3,25 € é irresistível demais pra um povo que assiste seus rios morrerem lentamente. Desculpa, desabafo político aqui.
ALERTA
Por enquanto não existem muitas opções veganas ou vegetarianas no cardápio, tomara que isso mude para as gerações seguintes.

Voar, voar… subir, subir…

Na parte de cima do barco tem um café bem legal. Nos dias de tempo bom pode valer a pena dar uma passada lá. Curti quando fui. Só uma vez, mas foi bacana.
Algum megaevento esportivo rolando? Normalmente eles transmitem algumas partidas de futebol na barge. Champions League quando tem PSG na fase de mata-mata (o que nunca dura muito, triste) ou mesmo a França nas Copas do Mundo e Eurocopa.
Copa do Mundo é um evento a parte, eles exibem todas as partidas das grandes seleções, exceto as do Brasil. Foi assim em 2018. Ou é raiva do Neymar, ou, no passado, alguns brasileiros tocaram o terror por lá.

Esplendor e sepultura

A barge é, em essência, um espaço de encontro barato e conveniente aos domingos. Repito, aos domingos, dia do brunch. Nos outros dias é como qualquer outro restaurante do CROUS, que existem aos montes pela cidade.
Quando você não se sentir mais turista na cidade, vai ver que os domingos realmente amanhecem diferente em Paris, e que o marco zero não é mais na Ile de la Cité. Quando perceber, já vai estar escutando o bom e velho avancez, s’il vous plaît ! da fila. Bon app’.
Share:

quarta-feira, 31 de julho de 2019

Queria que tivessem me dito isso no começo do intercâmbio


Hoje uma pessoa no trabalho me disse que ela não pode contar com meu julgamento porque ele não é objetivo.
 

Atualmente, estou fazendo meu estagio em Lyon. Foi uma das poucas oportunidades de trabalhar com engenharia de dentro da empresa - no escritório - ao invés de trabalhar no canteiro de obras. Foi também a primeira oportunidade de observar o ambiente corporativo francês. O modo como as pessoas se comportam, sobre o que elas falam, como elas se vestem e quais características são louvadas e quais são execradas.

Ainda não tinha trabalhado em escritório estando na área da construção e algumas das minhas experiências anteriores na França para compensar a falta de bolsa de estudos - o que afetou bastante meu desempenho escolar - haviam sido :
  • Como garçom
O Hotel/Restaurante era luxuoso então recebia pessoas do mundo inteiro que passavam por Paris. Encontrei produtores brasileiros de café tentando vender café na França (aparentemente apenas 2-3 pessoas vendem o café brasileiro em toda Europa, se você tenta não passar por essas pessoas, você é boicotado), alemães que trabalhavam nas grandes corporações de direito europeu, artistas que trabalhavam na Paris Fashion Week, americanos de todas as partes dos EUA - inclusive me perguntaram se fazíamos hambúrguer, o que deixou o chefe do restaurante extremamente nervoso.
Eu era o único garçom/caixa/assistente de cozinha/bartender/faxineiro nos fins de semana, posso te confessar que em relação aos preços dos pratos, eu pagava meu salario em um dia de trabalho. Porém meu contato era em grande maioria com turistas, pessoas que estavam felizes por estarem ali. Não havia contato com a gerência do restaurante nem com o grupo que gerenciava o empreendimento.
  • Como freelancer em informática
Aparentemente é uma realidade tanto no Brasil quanto na França: as pessoas que trabalham com informática são exploradas. Nunca recebi tão pouco pelo tanto que fazia. Encontrei pessoas de todos os tipos e nacionalidades, entrei nos escritórios de La Défense com a vista sobre a Fundação Louis Vuitton e mais ao fundo sobre a torre Eiffel para instalar computadores estando com fome e com frio durante um dia inteiro.
O problema não era o trabalho, trabalhar nunca é um problema. O problema principal era a falta de dignidade de condições ideais de trabalho. Um padrão muito interessante era que os estrangeiros eram empregados com contratos de curta duração (Mini-CDDs) e os franceses conseguiam contratos de longa duração (CDI).
  • Como estagiário de Engenharia Civil em um canteiro de obras
Embora tenha sido uma experiência extremamente dura e em certos momentos traumatizante, foi minha primeira experiência direta com engenharia civil. Eu não tive contato com muitas pessoas nem estava inserido no ambiente de trabalho da empresa que eu fazia parte. Dentro do canteiro existia uma relação de suserania e vassalagem, uma hierarquia infelizmente necessária mas não menos excruciante. A parte mais interessante foi ouvir a experiência dos pedreiros, dos artesãos e das pessoas que faziam parte do verdadeiro trabalho do canteiro, de produzir diretamente aquele edifício. O canteiro é um ambiente multicultural. Eu falava mais português do que francês durante meu estágio. Logo não havia contato com a tal da cultura corporativista francesa.
Esse estágio como Engenheiro de Métodos (Ingénierie Méthodes) em Lyon foi a primeira oportunidade fora da Escola de Engenharia de entender como a engenharia funciona fora do canteiro, ou de uma maneira mais generalista, como são certas relações de negócios na França. Estando nesse novo ambiente, pude comparar como ele reflete ou deflete em relação aos ambientes anteriores.

Mesmo que tenhamos reflexões relevantes internamente - diga nos comentários abaixo se você concorda - sinto que nunca fui estimulado à compartilhá-las no Brasil. Sempre que não gostava de algo, era melhor dizer que estava bom pra não “ofender” a pessoa do que dizer a verdade - mesmo que de modo construtivo. Lembro inclusive de situações na vida no trabalho que se opor à hierarquia presente era visto como um desafio. Tanto na sala de aula quanto no trabalho existem relações hierárquicas muito fortes onde os chefes e os professores são criaturas a serem "adoradas".

Essas experiências moldaram meu comportamento, mesmo que em algumas famílias essa abordagem seja diferente, senti que na cultura francesa observei o incentivo contrário na grande maioria dos casos.

Desde pequenos as opiniões das crianças são ouvidas e incentivadas assim como postas em cheque. As crianças participam ativamente dos assuntos em pauta na mesa de um almoço de domingo. Uma opinião generalista como “isso é interessante” ou “isso é importante” é compreendida como inocente e fútil, então as crianças são incentivadas a dar respostas bem argumentadas e completas. 

E faz todo sentido. Uma frase como "isso é interesante" é relativamente normal mas nela falta precisão como : O que é importante exatamente? Qual é o objeto da conversa? Se estivermos falando sobre direitos humanos, qual aspecto dos direitos humanos é importante ? Em quais situações você está pensando precisamente quando faz sua consideração ? Essas situações são realmente regras ou são exceções ?

Existe uma certa genialidade em falar a verdade usando a retórica que é louvada na França. A eloquência é tida como a característica última das pessoas inteligentes. Escrevi isso no meu outro texto aqui. Talvez seja por isso que o RAP francês está tanto em voga. Para essa pessoa no meu trabalho em Lyon, eu não emitia opiniões suficientemente exatas. Mas pra quê dar uma opinião com um encadeamento lógico perfeito em um assunto que desconheço? Só pra parecer "genial"?

Eu diria até mais... em outras situações como no estágio no canteiro de obras, esse julgamentos objetivos passeavam bem próximos ao desrespeito.

Finalmente, em que situações nesses últimos dois anos uma adaptação foi necessária? Como discernir onde está uma frase "bien tourné" nessa linha entre o desrespeito e a "genialidade" ?

Um dos meus maiores receios desses dois anos foi ser mal compreendido. Falando uma língua que não era a minha, perdendo milhares de nuances culturais todos os dias e pisando em ovos a cada contato. Mas sabe, e daí? Mesmo se a gente cometer uns erros aqui e outros ali, somos capazes de aprender apenas no momento em que nos lançamos. 

Não tem problema você ultrapassar a linha, é até importante que você a ultrapasse correndo o risco de errar. 

Se você observar que a reação não foi das melhores, se você esforçou para se fazer entender e não deu certo, a melhor dica que eu posso te dar é muito simples :

Peça desculpas. Mas não tenha medo de errar.
Share:

terça-feira, 25 de junho de 2019

G16/EIVP voltando ao Brasil em um mês + MegaPack "Pisei na França e Agora ?"

Olá à todos vocês ! Aos que estão chegando, bem-vindos e aos que estarão partindo, simbora!

Nessa reta final do intercâmbio, o tempo tem passado depressa. Quase como se ele corresse pra próxima cena, para o próximo diálogo entre personagens. Esses anos pra mim e pra todos desse intercâmbio foi um ano de desafios. Cada um enfrentou dificuldades inimagináveis pelo caminho, encontrou respostas extremamente interessantes à partir dos desafios impostos.

Semana passada nós da EIVP apresentamos o trabalho de conclusão de curso ou travail de fin d'études. Na minha experiência pessoal, foi sensacional ser capaz de fazer a apresentação do TFE na EIVP, sozinho, para um jury de duas pessoas extremamente exigentes e que acolheram minhas idéias assim como meu raciocínio. Mesmo as idéias e as respostas que improvisei na hora da apresentação.

G16 - EIVP - Junho 2019

Estava pensando que ao contrário do clichê, não passou rápido. Foram dois anos sem bolsa, dois anos contando com a ajuda diária das pessoas ao meu redor. A razão de não ter desistido? Justamente essas pessoas me mostraram um apoio imenso, devo tudo isso à elas.

Nesse sentido, quero sempre tentar retribuir um pouco do que fizeram por mim. Então pra quem está chegando, vou escrever aqui um MegaPack de dicas. Correndo o risco de ser um pouco repetitivo em relação ao guia ENPC/EIVP, mas especificamente pra EIVP  :

1 - Alojamento :
A EIVP tem uma parceria com o CROUS Créteil e pedindo mais informações às pessoas na secretaria, ou por e-mail, eles podem conseguir uma vaga pra você. Não é uma promessa, mas uma possibilidade. Porém, uma vez que eles te enviam o e-mail de aprovação, você precisa responder o mais rápido possível pra garantir sua vaga. A segunda opção é procurar nos grupos do Facebook da EIVP.

2 - Celular / Chip :
Os correios (La Poste) vendem uma opção de chip pré-pago que você pode usar pra receber ligações, custam 10 euros aproximadamente.
Algumas operadoras como Free Mobile tem promoções em que você paga 1 euro por mês durante 1 ano, obtém 100 gigabytes de dados, ligações e mensagens ilimitadas.

3 - Banco :
Em 2018 e 2019, os bancos online finalmente chegaram na França. Pra maior parte das operações francesas, você precisa de um RIB francês, como pra receber algum auxílio estudantil ou o seu salário de estágio. Normalmente por lei, eles são obrigados a depositar no RIB que você fornecer. Mas a maioria dos softwares que eles usam pra organizar os RIBs, só aceitam números de RIB franceses.
NÃO ACEITE TODOS OS TERMOS DO CONTRATO DO SEU BANCO. Eles incluem diversos pacotes e serviços que você não vai usar ou que você pode encontrar em outros lugares mais barato como os seguros de alojamento.
Um bom banco é o Boursorama : https://www.boursorama-banque.com/?origine=2403
Peça à alguém um código de partenariat pra você ganhar 150 euros ao abrir sua conta.

4 - Transporte
Dentro de Île-de-France, você pode ir pra todos os lugares uma vez que você possua seu Passe Navigo. O plano estudante se chama Imagine-R. E finalmente, ele também pode ser feito online. Uma maravilha ! Se você não tiver um endereço aqui na França, entre em contato com os moradores atuais, tente negociar pra pedir com antecedência e mandar entregar na casa de alguém que irá te buscar no aeroporto. Ele demora um pouco à chegar e quanto mais rápido você adiantar, melhor pra ti !
https://www.imagine-r.com/

5 - Roupas de frio
As roupas mais baratas estarão na Primark. Existem algumas fora de Paris.
As roupas baratas, mas ainda assim em conta, você pode encontrar nos mercados de rua, principalmente no bairro de Belleville. Não hesite à comprar com alguns meses de antecedência. Um verão bem quente é certeza de um inverno ridiculamente frio por aqui.

6 - Se tornar 100% fluente em francês e francês técnico
Se eu pudesse fazer uma curva de aprendizado do francês desde que eu cheguei, seria assim :

Eu senti que aprendi muito nos primeiros meses e depois de um tempo, senti que não estava conseguindo fazer nenhum avanço durante vários meses. Me perguntei qual o motivo, tentando encontrar uma resposta em mim. Estava bem aí meu erro.

Quando usamos uma linguagem, nós temos modelos mentais do que significam as palavras e as expressões que elas contém. Como quando falo "esse trem é bom", a palavra "trem" na minha mente é um modelo genérico de qualquer elemento que eu esteja com vontade de destacar - logo uma das vantagens em ser mineiro. Pode parecer simples, e é. Esse modelo mental foi aprendido por mim ao longo das minhas interações com as pessoas. A única maneira de você aprender alguns desses modelos mentais é com os franceses. Sem a integração, sem ir nas festas com eles, sem conversar, puxar assunto mesmo aos trancos e barrancos, não há como você encontrar esses modelos mentais na internet - ou muito raramente.

Ainda mais complicado é o uso de termos técnicos em francês. No início, muitos termos técnicos fugiam à minha compreensão. Fiz um dicionário bem rudimentar francês-português em engenharia civil, mas prefiro não compartilhá-lo. Ao invés disso, forneço aqui um exemplar ainda mais completo da tradução inglês-francês em Engenharia Civil :

 https://drive.google.com/open?id=1BHteQsEIuwXzDHviKC9f7M1jDAX6tLo9


7 - As vantagens de não ser um especialista - Tente aproveitar ao máximo as conferências e atividades extraclasse propostas pela EIVP e procure outras, mesmo que o tempo esteja curto ! São essas participações que vão te dar as referências, o espírito crítico e o vocabulário em engenharia na língua francesa
Estava lendo essa matéria muito interessante sobre como pessoas que são generalistas - pessoas que se interessam por uma variedade de assuntos - tem uma flexibilidade em adaptar o conhecimento entre essas áreas que pode levar à contribuições surpreendentes.

A EIVP é uma escola de engenharia generalista. Ela forma engenheiros que sejam capazes de se adaptar à diversas situações. Num mesmo dia você vai calcular e dimensionar uma laje em concreto e vai realizar um projeto que precisa atender uma necessidade - que você deve ser capaz de absorver - de Paris e seus arredores.

O artigo está aqui, nesse jornal maravilhoso chamado Nexo Jornal.

Tente sempre adaptar sua história, sua cultura e quem você é para colocar em prática nos projetos da EIVP. O meu primeiro projeto da EIVP, me inspirei na arquitetura do Niemeyer na obra da Igreja da Pampulha. O primeiro projeto, o Projet Construction, é completo. Realizamos todo o processo de concepção desde a compreensão da necessidade do cliente até a entrega do projeto (dossier) como se fosse uma resposta à uma licitação (appel d'offre). Não era um projeto perfeito, não foi um dos meus melhores trabalhos, mas foi uma maneira de dizer que sentia saudades de casa.


E logo chego aí em casa.
Share:

sexta-feira, 5 de abril de 2019

A cadência francesa

Le Crotoy - Normandie

Desde que cheguei, tenho me apaixonado um pouco mais pela humanidade. A maneira de ser e interagir, toda essa sensibilidade que reina logo abaixo dessa camada superficial de palavras. Ao mesmo tempo, percebi que a maior parte das observações que tenho sobre a França são iguais ou muito parecidas com nosso comportamento brasileiro. Não existe uma grande diferença assim apenas sutilezas. Uma delas é a cadência.

Primeiro, gostaria de definir o que entendo por cadência. Não sei a definição linguística mas defino aqui como o ritmo que conduzimos ao compor uma frase oralmente.

Por exemplo, no português marcamos nossa cadência colocando vírgulas em posições definidas na frase. Essas vírgulas embora nem sempre condizem com o que os gramáticos gostariam que fosse feito, ditam sobre as pausas quando falamos. Aqui nesse texto é a melhor forma de demonstrar o que quero dizer.

No português poderíamos fazer uma frase falando:

1. Ontem eu estava em casa, lendo um livro, e miraculosamente do nada, alguém bateu na porta.
2. Ontem, eu estava em casa lendo um livro, e miraculosamente, do nada, alguém bateu na porta. 

É uma mudança muito sutil nas pausas que fazemos que não faz muita diferença na língua portuguesa. A função da língua foi cumprida: a história foi compreendida, a informação transmitida.

No francês, essas pausas são uma regra. Uma mesma história pode deixar de ser compreendida se você não colocar as pausas no lugar apropriado. Elas são muito mais importantes e de fato sem a presença do silêncio, a função da língua - de transmitir uma informação - não seria cumprida. Os franceses não entenderiam. Isso provoca uma confusão gigante. Nunca sabemos quando alguém terminou de falar algo ou quando "podemos" falar - sem sermos extremamente mal-educados.

E ainda no francês parisiense, se você não terminou de concluir um raciocínio é melhor você estender o som de uma vogal do que deixar uma pausa. A pausa simboliza o fim de uma construção lógica dentro da composição de uma frase.

Quando aprendemos as três possibilidades de fazer uma pergunta em francês, reafirmo que são uma verdade extrema. Não existe a possibilidade de que algumas palavras mudem de lugar e dê certo. Eles não entenderiam a frase.

Essa forma é sempre muito bem definida.

Mesmo que uma pessoa seja inteligente e competente, a definição de alguém brilhante ou genial na França é diretamente ligada ao domínio da linguagem corporal e oral. Um domínio do tempo entre a colocação das palavras. Um domínio da cadência.

A questão central têm sido como alguém consegue controlar ou provocar na mente do seu interlocutor uma combinação perfeita. Ajustando cada intensidade das palavras escolhidas na frase.

Eu cito essa intensidade das palavras porque a provocação é algo muito importante nesse "ambiente intelectual" francês. A provocação consciente dentro da cultura francesa é a prova de um certo brilhantismo radiante e que a princípio, me causou um choque cultural.

Ao mesmo tempo, deixo pra você o questionamento final, quais desses comportamentos são tão diferentes assim do que temos no Brasil?
Share: